quinta-feira, 14 de maio de 2009

Crónica do Mês - Junho

Esta coisa de um gajo ser pai faz-me pôr para aqui a pensar, angustiado, se algum dia serei capaz de cumprir com o meu papel enquanto educador. Assim do mesmo género que o município esposendense – EDUCADOR – com letras grandes. É que tenho cá a ideia de que os putos nos vêem como umas coisas muito estranhas, difíceis de decifrar, estúpidas e incoerentes e, se ali no infantário da santa casa tivessem um blog como o “Conversa”, haviam de atulhar a caixa dos comentários com aqueles recadinhos de nos pôr orelhas a arder, enquanto nos mandavam ganhar juizinho.

E lembrei-me de reflectir sobre isto, porquê?

É que princípios fundamentais em educação como o dever dar o exemplo, por exemplo, é coisa que tendemos a deixar escapar, acostumamo-nos a um determinado estilo de vida completamente insustentável e, além de já não conseguirmos dispensar os vícios, ainda os transmitimos sem apelo nem agravo aos petizes que, confusos com o jogo dos opostos, se vão habituando ao bem-bom, ainda que o discurso elaborado dos progenitores não encaixe bem naquilo que são os seus reais hábitos, senão, vejamos: - (à noite a protestar com as notícias enquanto o puto nos mede) «ah… e tal… o aquecimento global que nos há-de assar o caco a todos, se não formos capazes de parar com a queima de combustíveis fósseis» (na manhã seguinte, sexta-feira, infantário a cem metros, menino no carro e, upa, que assim ainda se poupam cinco segunditos na ida para o trabalho); (à noite a protestar com as notícias enquanto o puto nos mede) «ah… e tal… a água doce no planeta que está a esgotar-se e haveremos de morrer secos que nem uvas passas, se não a pouparmos» (na manhã seguinte, sábado, toca de ir ali com o rapaz lavar o carrinho e pô-lo a brilhar, que amanhã é dia da voltinha domingueira); (à noite a protestar com as notícias enquanto o puto nos mede) «ah… e tal… a Amazónia está a desaparecer e vamos ficar sem o pulmão da Terra, porque os americanos da McDonald´s estão a desbastar a selva e a substitui-la por pastos para as vaquinhas» (domingo ao almoço, upa, para o shopping comer uns hambúrgueres que o rapaz gosta) … depois vem-nos a perplexidade ao constatar que o puto, já adolescente, se sente desorientado.

A propósito de falta de orientação…

São já inúmeras as intervenções neste blog de alguém (sim, aqui é hábito emitirem-se “corajosas” opiniões sob o escudo do anonimato) que nos questiona e se lamenta, de modo reiterado e de ânimos acicatados, sobre a crueldade que é não podermos construir a nosso bel-prazer naquilo que é nosso ou em rentabilizar ao máximo a venda do nosso terreno situado em plena zona verde. Ora, arcaísmos desta grandeza, infelizmente, já deixaram de me surpreender há muito tempo, mas vamos lá ver se serei capaz de contar brevemente a parte final de uma história que terá tido o seu início no tempo dos romanos.

Obviamente que para qualquer comum mortal é legítimo desejar extrair todos os benefícios ou vantagens que um bem ou uma coisa sua lhe possa prestar. E é precisamente por essa evidência que os legisladores, logo no texto constitucional, separaram o direito de propriedade (garantida no artigo 17º. da Declaração Universal dos Direitos do Homem), do direito de construir, pois, se os poderes conferidos aos proprietários fossem absolutos e ilimitados, como poderíamos garantir, por exemplo, a construção de estradas e outras vias de comunicação ou de distribuição de energia, a preservação dos recursos minerais ou hídricos, a manutenção da nossa herança cultural e a protecção do nosso valiosíssimo património paisagístico, em suma, a salvaguarda do interesse público? Ou será que este não deve preponderar sobre o privado? Se o direito de construir não fosse regulado, o que é que impediria cada proprietário de edificar os absurdos urbanísticos que bem entendesse, um após o outro, de modo desconexo com o seguinte, até transformar o conjunto denominado de cidade num território sem a harmonia necessária e fundamental para a nossa qualidade de vida e bem-estar social.

Felizmente, e tendo por base princípios gerais de sustentabilidade e de planeamento urbanístico, as sociedades modernas implementaram as suas políticas de usos e ocupação dos solos, a que chamamos de planos de ordenamento do território e nos quais se incluem os sobejamente conhecidos Planos Directores Municipais (PDM). E Esposende tem um, senhor anónimo. Mas compreendo a desorientação. Em Esposende – MUNICÍPIO EDUCADOR – com letras grandes, temos o hábito, por exemplo, de ensinar as criancinhas a plantarem árvores com um palmo de altura ao lado de um robusto pinhal destruído para projectos de índole imobiliária e de desenvolvemos elaboradas campanhas para sensibilizar as criancinhas a não pisotear a vegetação das dunas ao lado de luxuosas moradias para veraneio edificadas em pleno sistema dunar …

Enfim… tenhamos esperança que o próximo PDM, cuja discussão pública deverá estar para breve, venha de uma vez por todas restringir a dispersão da construção para os, cada vez mais escassos, solos de comprovada aptidão agrícola e de relevante valor ecológico, promovendo efectivamente a vontade de reconversão dos decrépitos centros urbanos consolidados.

Só por esta via a nossa terra se pode tornar mais atractiva e competitiva.

Jorge Silva - jorgesilva560@gmail.com - www.verdes-ecos.blogspot.com

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